domingo, 31 de julho de 2011

Gestos comuns.

O sorriso e o abraço de saudades marcam o reencontro. O cheiro de cigarro, característico, e as bebidas pelo chão, não surpreendem. Depois daquele tempo cheio de desculpas e da falta de vontade de se encontrarem, ela se pergunta se aquilo acontece.  

“Tu tá bem? Tá vivo? Que saudades”, diz. A noite continua como se fossem íntimos. Histórias envolventes a todo instante. Olhar de confidentes. Confidentes de histórias e sentimentos. Aqueles que não significam a relação deles.  

A cada cinco minutos, uma cerveja sai da geladeira. Uma história também. Um cheiro, um aconchego. Até que o passado foi desenterrado.

- “Por que nunca namoramos?” – pergunta ele.

Ela pensa: “Ora, que pergunta idiota, tu sabes muito bem”. Mas responde:

- Eu era muito grudenta.

- Certo. Provavelmente era isso.

Na verdade o motivo não deveria fazer diferença. A teimosia dos dois fez com que aquilo não acontecesse. Eles se gostavam. Eles se gostam. Mas não têm motivos e nem disposição para confiar um no outro.

O silêncio toma conta. Cervejas continuam sendo abertas para esquecer os problemas. Graves ou nem tanto, cada um tem uma vida, sem poder contar com a ajuda do outro.

É hora de dormir. “Boa noite” são distribuídos como se fossem comuns. Eles pegam no sono. A mente e o corpo não relaxam nem enquanto descansa. Qual é o problema, o rancor, o medo e a angústia?

O dia amanhece. A noite conturbada se identifica com a rapidez ao sair da cama. O cigarro e a bebida o esperam.

A porta serve como escoro. A observação é obrigatória. A torcida para que se importe com algo é constante.

- Estou indo embora. Tem certeza que vai me deixar ir?

O caminho do elevador é sempre curto. Peço que fique bem, que se cuide. E imagino o encontro daqui há anos, para sentir o abraço, matar a saudade, e se sentir à vontade com seus vícios. 

domingo, 24 de julho de 2011

Ao meu lado.

A lembrança está ao meu lado durante todo o dia. A coragem para eliminá-la demora a chegar. Fica o medo de que aqueles dois anos sejam jogados no armário, junto com aquelas coisas sem importância e jogadas fora em época de mudanças de endereço.

Os olhos embaçam, o coração dispara. Ao mesmo tempo em que a tristeza chega rápido para lembrar que não haverá mais momentos felizes, a mente lembra dos já passados. O almoço, as compras no supermercado, a primeira janta, o vinho, o filme, as primeiras palavras. Os inéditos e novos carinhos, o calor, a proximidade. Os primeiros beijos, e aquela noite.

Todas as atitudes surpreendiam. Conhecer e ficar mais próximos eram os passos certos para chegar o dia do pedido, da lâmpada, dos chocolates, do eu te amo. Crescia o apego, o carinho, o desejo. Os sonhos começavam a fazer sentido.

As coisas amadas em comum. A fotografia, as viagens, a culinária, os futuros loirinhos. Coisas que tu aprende a gostar pelo outro. A aviação, o jornalismo. Busca diária de empregos na mesma cidade e de internet para se falar quando se estava longe.

A alegria se manifestava pelas pequenas coisas. Aquelas insignificantes. Tudo era melhor e mais alegre. Nenhum esforço era em vão, como o de dormir juntos na cama de solteiro.

Então, o dia amanheceu cinza. Os rostos começaram a ser estranhos. O que os fazia felizes não tinha mais sentido. As brigas por um fio de cabelo se tornaram comuns. O sorriso não mostrava mais os dentes. Por um erro, perdeu-se a confiança. Eu percebia que por mais que eu tentasse e fizesse de tudo para o sorriso e a felicidade voltarem, era tarde.

A imagem dos nossos pés me lembra que queríamos seguir o mesmo caminho. Que os planos eram feitos para isso. Mesmo assim, vejo que nenhuma coragem será suficiente para esquecer e guardar o que restou ao meu lado, o porta-retrato.